O ano era 1997 e eu tinha apenas 11 anos. Tive a sorte de ter uma tia adolescente que andava para cima e para baixo com o seu CD - Titãs Acústico MTV. Tia Ana me emprestou o CD e eu fiquei apaixonada pela música “Flores”, cantada pela linda voz de Marisa Monte. Foi a primeira vez que escutei Marisa com outros ouvidos. Senti cada frase, não as entendi pela sua complexidade, mas fiquei eufórica e algo cresceu dentro de mim...
Eu que já era uma criança curiosa com as poesias de Cecília Meireles vi poesia na música de Marisa. Anos depois, peguei emprestado o CD Memórias, Crônicas e Declaração de amor! Já estávamos no ano 2000; o mundo não tinha acabado e eu seguia sendo julgada pelas minhas escolhas na sala de leitura daquela grande escola pública. Eu havia furado uma bolha de gostos e interesses através dos livros escolhidos e das músicas que fui apresentada.
Aquela menina da periferia, escutou “AMOR I LOVE YOU” e lembra até hoje da voz do Arnaldo declamando um trecho da obra de Eça de Queiroz:
Sentia um acréscimo de estima por si mesma
E parecia-lhe que entrava enfim numa existência superiormente interessante
Cada passo conduzia a um êxtase
Recordo que apresentei a música para minha classe. Carreguei na mochila o CD emprestado, o papel transparente para usar no projetor e mostrei para todos o que eu considerava mágico. A arte através da música me conectou com as palavras, abriu meu repertório, e me fez ser uma criança estranha para aqueles que estudavam comigo.
Na mesma escola, já sabendo que eu era julgada como “diferente”, eu me apaixonei por Monet. Me abri para sensações e para nomes que não faziam parte do meu cotidiano. Me envolvi em um ambiente de beleza, biografias, livros e muita curiosidade.
Durante os demais anos percebi a cultura, a diferença e a história através de movimentos artísticos e de muitos nomes. Me apaixonei pelas palavras de Mario Quintana, Drummond e além do Monet, entendi que o período renascentista era sem dúvida o meu favorito entre as pinturas...
As cores, os sons, as rimas e os textos me impressionam até hoje. Quem sabe, esse foi o impulso para seguir e escolher uma nova profissão com meus 35 anos de idade. Me achei na escrita e hoje pincelo o mundo com minhas palavras. Penso que ao escutar “Flores” pela primeira vez, meu coração se abriu para algo inexplicável e me emociono pensando na importância daquele CD emprestado.
Toda essa trajetória e mágica que a arte construiu e constrói em minha vida, me fez perceber hoje, escrevendo este texto, que ela pode ser explicada de forma simples: divido com vocês que a arte é como se a minha alma se cobrisse de um luxo radioso de sensações...
Texto redigido para um evento na escola das minhas filhas. Reflexão sobre a importância da arte em nossas vidas em Abril/ 2023
Fabiana C.O